segunda-feira, setembro 19, 2011

Cresce o número de crianças que são devolvidas pelos pais adotivos em Belo Horizonte


Pela primeira vez, o órgão prepara levantamento de ocorrências do tipo, que deve ser divulgado em dezembro deste ano

Daniela Garcia - Do Hoje em Dia - 19/09/2011 - 04:08

Cresce o número de crianças que são devolvidas pelos pais adotivos em Belo Horizonte. A afirmação é da coordenadora de orientação e fiscalização das entidades sociais da Vara Cível da Infância e da Juventude, Nádia Queiroz. Pela primeira vez, o órgão prepara levantamento de ocorrências do tipo, que deve ser divulgado em dezembro deste ano.

"Esses casos sempre foram raros. Mas percebemos um aumento significativo nesse último ano", explica Nádia. Com 20 anos de experiência na Vara, a psicóloga e coordenadora técnica Rosilene Miranda estima ter atendido mais de dez situações de devolução.

Muitos casos tramitam em sigilo pela Justiça, por isso, passam despercebidos pela sociedade, segundo a professora de sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Lygia Quartim. "Pai adotivo querer devolver uma criança é mais comum do que se sabe", avalia.

Em Minas Gerais, o Tribunal de Justiça nunca tratou de destituição do poder familiar de pais adotivos, como afirma o presidente da comissão de defesa dos direitos da criança, adolescente, jovem e idoso da OAB-MG, Stanley Ramos.

Mas no Sul do país, um casal de Santa Catarina - seis anos após adotar dois irmãos - tentou devolver o mais velho, alegando problemas de relacionamento. Com isso, eles perderam a guarda do garoto, de 12 anos, e da menina, de dez, e tiveram que indenizar cada criança em R$ 40 mil.

Stanley Ramos diz ter ficado "estupefato" ao saber da atitude da família catarinense. "Eu mandaria prender. Isso é contra a humanidade", endossa. Ele explica que em casos semelhantes, os responsáveis poderiam responder a crime de abandono de incapaz ou por maus tratos.

A Justiça deveria ser mais rígida tanto com os pais adotivos que abandonam os filhos, quanto com os responsáveis que desistem da guarda, na avaliação da coordenadora do TJ Criança Abriga, Flávia Figueiredo.

Atualmente, a instituição abriga um menino e uma menina, de 4 anos, que foram devolvidos pelos pais responsáveis pela guarda deles, em menos de um ano. Ambas foram entregues aos prantos na instituição e, hoje, recebem acompanhamento psico-terapêutico. "O segundo acolhimento numa instituição é ainda mais traumático. Na cabeça da criança fica a ideia: ninguém gosta de mim", analisa.

Em um primeiro momento, a criança fica sob a guarda da família, geralmente por um ano. Nesse tempo, o termo de guarda pode ser revogado pela vontade dos pais ou por uma sentença do juiz, como explica a assistente social da Vara Cível da Infância e Juventude de BH, Lúcia Regina.

A pesquisadora Maria Lygia critica essa prática da guarda sem responsabilidade legal dos pais. "É um escândalo devolver depois de seis anos, mas depois de um ano não é crime devolver", ironiza.

Rosilene Miranda, psicóloga da Vara, afirma que são muitas as sequelas para as crianças que são abandonadas também pelos pais adotivos. "A criança vai ter mais dificuldade em criar vínculos, e perder a confiança em si mesma e nos outros". Além disso, ela reforça que a criança pode perder a única chance de ser adotada, já que a maior parte dos pretendentes à adoção deseja crianças de até três anos.

A maioria dos pais aponta como motivo de devolução a dificuldade de relacionamento com o menor. "Eles chegam a dizer que as crianças são muito teimosas e podem entrar em uma situação de risco", exemplifica Rosilene. E afirma que a Vara oferece sempre ajuda psico-social à família e que esclarece sobre o universo infanto-juvenil aos pais antes de firmar a guarda.

Fonte: Jornal Hoje em Dia 

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