segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Cidadania chega de barco ao Pantanal

Comunidades ao longo do rio Cuiabá na região pantaneira recebem serviços inexistentes nas localidades. Mais 670 assistidos em iniciativa. Jornada começa pelo rio Cuiabá a partir de Porto Cercado. Para acessar comunidade, grupo precisa percorrer afluentes em meio à mata.

A população das águas pantaneiras de Mato Grosso recebeu ao longo das últimas semanas um banho de cidadania. Partindo de uma chalana em Porto Cercado, região de Poconé, a expedição Ribeirinho Cidadão, da Defensoria Pública, levou assistência jurídica, atendimentos médicos, oftalmológicos, dentários, emissão de documentos pessoais como RG, CPF e título eleitoral, e a possibilidade aos ribeirinhos de efetuar cadastro no programa Bolsa Família, do governo federal. A reportagem acompanhou os trabalhos.

Até a última sexta-feira, um balanço da Defensoria Pública já apontava que 672 pessoas haviam sido beneficiadas com a emissão de documentos e atendimentos clínicos. A expectativa é atender mais de três mil pessoas. Dados das sentenças judiciais ainda não haviam sido contabilizados. A reportagem esteve na expedição por seis dias e acompanhou, por exemplo, a emoção de uma mãe ao ver o filho assinar o primeiro documento de identidade.

Eu tenho muitos parentes que ainda não foram registrados. O que aconteceu comigo eu não quero que aconteça com ele , disse Carmem Leda da Silva, moradora do Distrito de São Pedro de Joselândia, no município de Barão de Melgaço. O mesmo ocorreu com Manoel Gonçalves, também morador da localidade, que na altura dos 50 anos ainda não tinha o registro de nascimento. No Ribeirinho Cidadão, Gonçalves solicitou carteira de identidade, CPF e título de eleitor.

Para o coordenador do projeto, defensor Air Praeiro, a cidadania é um direito de todos e isso tem que ser expresso na prática. Nós temos obrigação de atender os necessitados. Se o cidadão não puder vir à Justiça, a Justiça irá até ele , define.

Para chegar ao primeiro destino, São Pedro de Joselândia, a expedição partiu de barcos por duas horas ao longo do rio Cuiabá. Em alguns pontos, os barcos passaram por grandes dificuldades já que a altura das áreas alagadas não passava de um palmo. Na época das cheias, a comunidade só é acessada pelas águas.

A comunidade tem mais de três mil habitantes e é a mais estruturada entre os distritos de Barão de Melgaço. À primeira vista, a população é pacata e vive numa simbiose com a natureza. A infraestrutura do distrito é precária e os atoleiros nas ruas saltam aos olhos. Existe uma agência dos Correios e uma escola. A diversão para a população jovem se restringe a um campo de futebol.

Um bar movimenta o distrito e, aos finais de semana, funciona como pizzaria e um local para assistir a filmes. Esse extrato do Pantanal não é miserável, mas carente de serviços públicos. É o que aponta o agente de saúde do distrito, Mário Márcio. Nós não temos policiais e nem uma delegacia. Qualquer ocorrência policial vai para Barão, se resolve a situação também em Santo Antônio (de Leverger). Ano passado, o distrito registrou um homicídio. A droga também já é utilizada por muitos jovens locais.

Sem estrutura na área da saúde, as mulheres que engravidam na comunidade deixaram as parteiras, uma raridade no local, para ter os filhos em Cuiabá. Segundo o oficial de Registro Civil de Joselândia, Ari Dias Brandão, só em 2010, 15 crianças nasceram na comunidade, mas foram registradas em Cuiabá. Nos próximos anos não teremos mais pessoas nascidas aqui , estima Brandão.

A passagem do Ribeirinho Cidadão pelo distrito também possibilitou a realização de casamentos. No distrito, foram quatro. O casal Joselito da Silva e Lúcia Rodrigues se casou após 27 anos de vida em comum. Foi a oportunidade que faltava. A gente sempre enrolava e agora deu tudo certo, diz Lúcia.

PERCURSO - Além de Joselândia, a expedição seguiu rumo às comunidades de Conchas, Cuiabá-Mirim, Barão de Melgaço, Barra do Aricá, Agrovila das Palmeiras, entre outras. Com o Ribeirinho Cidadão deixamos de lado o formalismo do Judiciário para o cidadão sair com a sentença, o parecer do Ministério Público e com os documentos pessoais , finaliza o defensor público-geral André Prieto. Fazem parte da iniciativa o Tribunal de Justiça, o Ministério Público Estadual, a Polícia Técnica, a Caixa Econômica Federal, a prefeitura da Barão de Melgaço e a Defensoria Pública.



Fonte: Diário de Cuiabá/MT

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