segunda-feira, julho 02, 2012

Adultos que vivem no exterior descobriram uma forma de obter cidadania estrangeira “comprando” pais adotivos na Europa


O novo e ilegal jeitinho brasileiro

Adultos que vivem no exterior descobriram uma forma de obter cidadania estrangeira “comprando” pais adotivos na Europa

Carmo do Rio Verde, Ceres e Rialma (GO) — Depois do casamento falso para viver o sonho americano com um green card na mão, brasileiros adultos descobriram um novo método ilegal de conquistar cidadania estrangeira. Eles estão “comprando” pais adotivos na Europa. O esquema começa com uma procuração assinada pelo estrangeiro, declarando o desejo de ter o brasileiro como filho devido a um vínculo afetivo, e termina em comarcas do interior de Goiás, atualmente abarrotadas de processos de adoção do tipo — muitos já foram deferidos. O Estado de Minas identificou pelo menos 75 ações dessa natureza, ajuizadas entre 2011 e 2012, em nove cidades goianas, incluindo Goiânia. Na maioria dos casos, o brasileiro mora fora, quase sempre em Londres, e o seu adotante vive em Portugal.
As formalidades de uma ação de adoção, como ouvir pessoalmente as partes, têm sido dispensadas por alguns juízes goianos baseados no entendimento de que todos os envolvidos são maiores de idade e, portanto, capazes. Tudo é feito por procuração. Dada a sentença favorável, o brasileiro se torna oficialmente filho de um português, italiano ou inglês, por exemplo. Condição suficiente para retirar os documentos de cidadão do respectivo país e usufruir de todos os benefícios — como acesso ao mercado de trabalho, à seguridade social, à saúde pública e o livre trânsito na União Europeia.
O esquema internacional de fraude às leis de imigração teria base em três países: Reino Unido, Portugal e Brasil. No centro de toda a negociação, estão brasileiros em Londres, que oferecem o serviço de obtenção da cidadania por meio da adoção a seus conterrâneos ilegais na Europa. Se o interessado não tem um estrangeiro disposto a adotá-lo, o intermediador faz a ponte com algum europeu que tope vender o nome, geralmente em Portugal.
Tal modus operandi foi revelado, em uma conversa gravada, por um advogado que cuida de pelo menos 58 processos do tipo em Goiás. “Uma pessoa em Londres sempre está encaminhando serviços para a gente. Tinha uma firma, chamada Fênix, mas parece que fechou as portas, passou por uns problemas”, conta Paulo Alves Ferreira da Silva, que tem escritório em Ceres. “A gente faz a adoção e só recebe (o pagamento) quando está pronto. Mandamos a cópia dos documentos e a pessoa faz o pagamento. Não recebemos nada adiantado.” Quanto aos resultados, é otimista: “Numa comarcazinha aqui do interior, conseguimos que um juiz lá deferisse para nós. Então, fizemos mais de 100 processos”.
Euros Sobre o valor geralmente cobrado pelo estrangeiro, Paulo explica que costuma variar bastante. “Tem gente que pagou 15 (mil euros), pagou 10, pagou cinco, depende muito. Se cobrarem muito de você, se for uma coisa exorbitante, você conta comigo, que vou ver se lhe ajudo.” Quanto aos próprios serviços, informa que cobra em torno de R$ 7 mil, mas que a negociação deve ser feita por Londres.
Consultado pelo Estado de Minas sobre informações a respeito das adoções em comarcas pelo interior do estado, o Ministério Público (MP) de Goiás informou ter acionado, há menos de uma semana, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) da própria instituição para investigar o caso. “Tomamos conhecimento porque cerca de 10 processos chegaram ao segundo grau com características no mínimo inusitadas. Eram europeus, a maioria residente em Portugal, querendo adotar brasileiros residentes em Londres”, conta a procuradora Laura Maria Ferreira Bueno. Para ela, há indícios de que o objetivo das adoções seja o de regularizar a situação no exterior.
A partir desta semana, juízes de algumas comarcas terão de prestar informações ao Tribunal de Justiça de Goiás. “Queremos saber se há um volume de processos fora do padrão”, diz Carlos Magno Rocha da Silva, 1º juiz auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás.

Fonte: Jornal Estado de Minas

Nenhum comentário: