terça-feira, março 13, 2007

Artigo - Falta que os Poderes se entendam - por Walter Ceneviva

Li há tempos declaração do desembargador Caio Eduardo Canguçu de Almeida, do Tribunal de Justiça de São Paulo, pela qual "o Poder Judiciário luta contra uma legislação que emperra a máquina judiciária". Nesse emperramento também está o tratamento da criminalidade. Lembra Canguçu de Almeida que a "administração penitenciária está afeta ao Poder Executivo". Ambas as declarações são corretas, com o acréscimo de que o Legislativo se mostra desatento no aprimoramento das leis. É preciso reconhecer, porém, que o Judiciário poderia e deveria acompanhar as votações no Congresso com dados de sua experiência para projetos relativos a processos judiciais.

Nesse campo, a Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul tem manifestado posições firmes, servindo de exemplo à campanha contra a violência juvenil e sua prevenção. A presidente Denise Oliveira Cezar, em editorial no jornal da entidade, lembrou situações em que o Judiciário agiu com independência. Exemplo dramático de injustiça se mostra quando a magistratura não impõe aos Executivos a obrigação inafastável de pagarem o que devem, mas não hesita no uso indiscriminado da penhora on-line para facilitar a cobrança dos créditos do Poder Público.

O congestionamento do Judiciário, já aqui tratando do exemplo de São Paulo, envolve responsabilidades dos três Poderes pela falta de providências desde quando o tsunami do crescimento processual não foi enfrentado, durante anos, pela busca de soluções para dar mais eficácia ao trabalho.

Em entrevista recente na "Tribuna da Magistratura", o desembargador Gilberto Passos de Freitas, corregedor geral da Justiça paulista, dizia do volume excessivo de serviços, que vem enfrentando por várias providências úteis, que não dependem de lei. Exemplo: a "carga rápida". Permite que o advogado retire autos, para extrair cópias, independentemente de petição e despacho, mas se obriga a devolver os autos logo em seguida.

Nos juizados especiais, uma série de formalidades tem sido afastada, com bons resultados. Adotou ainda o sistema de audiências públicas, em que segmentos da sociedade, profissionais ou não, se reúnem com juízes e debatem assuntos de interesse coletivo para aprimoramento dos serviços.

O Setor de Conciliação em segundo grau tem tido boa aceitação e pode contribuir para resolver os processos, apesar de a novidade da experiência sugerir aperfeiçoamentos. Passos de Freitas entende que o Legislativo pode ajudar a Corregedoria, tanto que "existem vários estudos e propostas para algumas autorizações, atualização ou alteração legislativa dentro da competência estadual". Os estudos sobre o juiz leigo têm boa perspectiva. Em estados como o Rio de Janeiro tem adoção bem acolhida.

No Brasil continental e heterogêneo, outro problema da magistratura está na diversidade das soluções disponíveis. O que vale para Roraima não vale necessariamente para Santa Catarina. A lei civil, comercial e processual é a mesma. As realidades socioeconômicas são diferentes. Os legisladores e os exercentes do Poder Executivo não chegam a entender os problemas do Judiciário, os quais, aliás, os juízes têm muita dificuldade em expressar com clareza. Mais diálogo livre de preconceitos pode ajudar.


*Advogado e ex-professor de Direito Civil da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, autor do livro "Direito Constitucional Brasileiro".

Fonte : Walter Ceneviva

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